Apenas três das nove áreas de avaliação são responsáveis por mais da metade (56%) das desistências de bolsistas da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) de mestrado e doutorado, nas universidades brasileiras.
A descoberta é da tese de doutorado de Patrícia Paiva, pesquisadora no Programa de Pós-graduação em Educação em Ciências (PPgECi) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Na lista, estão as engenharias, as ciências exatas e da terra e ciências agrárias, com respectivamente, 23,10%, 19,40% e 13,55% dos desistentes.
O estudo analisou os dados dos 9.247 bolsistas que deixaram a pós-graduação entre 2010 e 2018. Eles representam 4% de todos os pesquisadores que receberam bolsas através do Programa de Demanda Social (DS) da Capes.
Entendo que os orientadores têm que ser melhor preparados para lidar com as pessoas. Não somos máquinas. E as instituições têm também um papel muito importante para criar e manter uma integração acadêmica e social com os alunos que os protejam — afirma Paiva, autora do estudo.
Motivos que levaram a desistência
O trabalho ainda analisou 524 processos abertos na Capes, de 2009 a 2020, para identificar os motivos que levaram os bolsistas a abandonarem as pesquisas — nem todas as desistências levam à abertura de processos.
Dificuldades de adaptação (categoria que abrange dificuldade de deslocamento, falta de conhecimentos necessários e excesso de atividades com prazos curtos), desempenho insatisfatório e questões de saúde são as principais questões apresentadas. Além disso, em quase 70% dos casos mais de um problema foi dado como justificativa. Em relação à saúde, depressão (39%) e ansiedade (28%) são os que mais foram relatados nos processos.
Um pós-graduando tem que cumprir os créditos, fazer o estágio docente, participar de eventos, publicar em revistas científicas e, dependendo do programa,a revista tem que ter um certo nível. Além disso, claro, tem a qualificação e a defesa. Tudo isso num momento em que ele está se formando não só a vida acadêmica, mas construindo também a carreira e sua família — diz Paiva.
Moradora de Brasília, a engenheira Marcella Cortat, de 32 anos, decidiu abandonar o mestrado na área. Ela conta que “simplesmente não dava conta da carga de estudo”.
Chegava à universidade 7h ou 8h e saía às 23h, estudava muito e rendia pouco — lembra. — As crises de choro aumentaram em frequência e intensidade e eu percebi que o mestrado era fonte de estresse e medo. Não tinha mais como ficar ali.
Segundo ela, a experiência traumática com o curso deixou marcas. Ela conta que levou dois anos para se recuperar e até hoje sofre.
— Não posso te dizer que me curei. Estou para me formar na segunda graduação, porém estou emperrada no TCC (trabalho de conclusão de curso), que me lembra muito a exigência por produção científica no final da 1ª faculdade e no mestrado — conta Cortat.